quinta-feira, 19 de junho de 2014

A Filosofia Cristã e a Invenção Intelectual do Indivíduo


Por Acauan

Não foi a Filosofia Cristã que inventou o Indivíduo, mas este conceito praticamente não existia nas Filosofias e Doutrinas Espirituais do Oriente.  No Budismo e Hinduísmo, por exemplo, a ideia de Consciência Individual é quase que uma anomalia na Harmonia do Cosmos e o anseio principal da alma ao reencarnar é dissolver-se no Nirvana.

No Civismo Romano, um Homem era a posição que ocupava na Sociedade.  A única igualdade possível entre um Patrício Romano e um escravo era o fato de ambos serem mortais.

Os Gregos Socráticos entendiam perfeitamente o conceito de Indivíduo, mas Platão se perdeu um tanto na Analogia da Caverna, onde o mundo que vemos são apenas sombras da Realidade, enquanto Aristóteles estava mais preocupado com Física e Metafísica, em entender o Universo externo a ele próprio.

São a Escolástica e o Tomismo que reinterpretam a Filosofia de Platão de modo revolucionário.
Ao invés de entender que tudo que percebemos são apenas sombras de um mundo real superior, a Filosofia Cristã dividiu esta Realidade em mundo material, apreensível pelos sentidos e um Mundo Espiritual, fora de nossa percepção.
Até aí, em nada diferente de praticamente todas as Mitologias Religiosas.

A novidade é que no centro destes dois mundos a Filosofia Cristã colocou o Indivíduo Humano, capaz de entender o Mundo Natural pela inteligência e o Mundo Espiritual pela Fé.  
Com isto, o Homem era reposicionado da periferia da Realidade, onde era apenas um observador iludido para quem a Verdade se situava em algum ponto inalcançável à consciência do mortais.
O Indivíduo Humano passava a ser o ponto focal de toda Realidade, que ao olhar para baixo podia compreender por si as coisas da Terra e pela inspiração divina era capaz de vislumbrar os Céus. 
Daí o sentido da máxima de Santo Agostinho "Intellige ut credas, crede ut intelligas", entender para crer e crer para entender.

Temos aí a sacralização do Indivíduo, resumido na Teologia Cristã no Princípio do "Homem Sozinho Perante Deus". O Homem dotado de alma imortal própria, cujo conteúdo da alma é construído por suas decisões, independente de quaisquer fatores externos.

O princípio da sacralização do Indivíduo Humano é a base de toda Moral do Ocidente e fundamento das Democracias Modernas.  Os que negam este Princípio e apontam o Iluminismo, particularmente o Iluminismo Francês, como uma ruptura com os conceitos medievais desconhecem, ou fingem desconhecer, que a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão não fariam o menor sentido em uma sociedade na qual o reconhecimento do indivíduo já não estivesse arraigada em sua Cultura.  Não por acaso o Iluminismo se deu na Europa e não na Índia, China ou Japão.

Os que acham que as ideologias revolucionárias materialistas são moderninhas não entendem ou não querem entender que sua visão da condição humana nada mais é que um retrocesso de dois mil anos. 
Ao deslocar o Indivíduo do centro de convergência da Realidade e substituí-lo pela "Sociedade", "Classe", "Nação" ou "Raça", coletivos abstratos sem consciência, tudo que fazem é reduzir este indivíduo a nada mais ou melhor que um animal mais esperto que os outros ou a espécimes sobre os quais a evolução natural e social (História) atuam sem que cada espécime por si só tenha alguma importância em particular.

Não é difícil concluir como este reposicionamento do Indivíduo leva inevitavelmente ao colapso moral, o que implica que, gostem ou não os Modernos, as possibilidades Humanas - sejam quais forem - ainda estão mais seguras se ancoradas na visão da Filosofia Cristã do que nas alternativas ideológicas disponíveis.

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